quinta-feira, 25 de abril de 2013

Notas fúnebres

(Dedicado ao Seu Toninho)

Podemos adiar vários encontros, atrasar em tantos outros, mas somos forçosamente pontuais quando é chegada a nossa hora...

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Anjos e outras miragens

Chove. O relógio na parede marca uma hora da manhã. Ao lado da cama de solteiro, fotos de um casal que pare estar feliz. O que seria a fotografia senão a tentativa de aprisionar o passado?, pensou. A chuva persiste. Na cabeceira, uma obra sobre anjos. Seria possível fazer um pedido a algum deles? O sono vem, mas a saudade continua. Já é tarde, os anjos provavelmente viraram as suas costas e já não mais ouvem pedidos inocentes...

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Conversando com o Velho Ateu

Chego à conclusão de que estou ficando cada vez mais louca. E confesso que adoro minha loucura. Quanto mais louca fico, mais me encontro. Tenho gostado da minha própria companhia. E quanto mais gosto da minha própria companhia, mais aberta fico para o coletivo. E se alguém discorda das ideias que brotam da loucura, as discordâncias (que são bem diferentes de discórdias) se transformam em alimento para a escrita.

Saí cedo para a labuta de sábado. Uma hora de viagem para chegar ao trabalho. Catei um cd na estante, liguei o som do carro e parti. Foi uma música do cd escolhido que, naquele momento, despertou a loucura que alivia a dor da existência. A música é doída, mas a dor também abre o caminho para que a fantasia preencha a alma:
O Velho Ateu
 (Eduardo Gudin / Roberto Riiberti)
Um velho ateu
Um bêbado cantor
Poeta
Na madrugada cantava essa canção seresta
Se eu fosse deus
A vida bem que melhorava
Se eu fosse deus
Daria aos que não têm nada
E toda janela fechava
Pros versos que aquele poeta cantava
Talvez por medo das palavras
De um velho de mãos desarmadas

A imagem das janelas se fechando para a poesia foi muito forte para mim... A imagem do medo das ideias de quem pensa diferente... Me doeu a dor do poeta. Não tenho religião, mas adoro pensar sobre a existência de Deus. Abri minha janela e acolhi o poeta. Depois abri também a porta, engatei meu braço no dele e saímos dançando pela manhã que, de repente, virou madrugada. Sentamos na calçada, com um copinho de pinga e uma cerveja até a madrugada se confundir com a própria vida naquela conversa-voo:
Não acreditas em Deus, Poeta? O que ou quem é Deus? Há quem diga que foi Deus quem criou a humanidade... Também há quem diga que foram os homens que criaram Deus... Penso que não dá para negar a existência de Deus, mas não cabe no meu pensamento (nem no meu coração) o Deus construído dentro das religiões hegemônicas no Brasil. Nos meus sonhos de poetisa desvairada, Deus não é pai nem mãe, não é feminino nem masculino, não tem forma, mas no universo da poesia pode ter cor e cheiro... Deus é a energia vital de amor que circula no universo... É a melhor energia que existe por aí, no ar e dentro dos seres vivos... Creio que tanto esta energia é produto da humanidade, quanto a humanidade é produto desta energia.


Sabe aquela história "do pó viemos e ao pó voltaremos" e da tal "vida eterna"? Energia pura, essência em forma de poesia... A gente nasce dessa energia, a vida principia num poema absurdo e concreto, cujo ápice é o ato sexual... E quando a gente morre - um outro poema - o que fica é energia que alguns chamam de espírito: o que se amou, o que se lutou, os gestos de carinho... Seja debaixo da terra, seja no mar ou em forma de cinzas, a energia que fica continua a influenciar a vida...


Também já me fecharam as janelas, caro Poeta... Puro medo... Medo da minha loucura, medo da minha fantasia... Medo do caminho de liberdade que existe dentro do pensamento... É mais fácil ser escravo do que ser livre! Nem todo mundo sabe voar! Tenho pena deles, que não percebem que tudo é poesia!


As religiões não são ruins, meu amigo, elas também transformam essência em poesia... As parábolas são poemas... Há quem goste, há quem não entenda, eu sempre gostei de versos livres e gosto de poesia que liberta... Às vezes as Igrejas usam a poesia para colonizar mentes e corações... Algumas correntes religiosas até ajudam no processo de libertação e rompimento com o sistema, acho louvável e respeito imensamente, mas minha fome de liberdade é ainda maior, quero sonhar meus próprios deuses, quero ligar-me a esta essência através da arte, do amor, da diversidade, da pluralidade!


Tu não estás sozinho! E nem eu! Tu com as tuas ideias e eu com as minhas podemos sim compartilhar carinho! Qualquer hora a gente se encontra de novo, nas esquinas da fantasia...

Despedi-me com um abraço apertado e um beijo no rosto. A madrugada virou manhã novamente. Acordei do sonho que sonhava acordada, desliguei o motor do carro e fui trabalhar com a alma repleta de poesia.

- Bianca Velloso -