domingo, 19 de janeiro de 2014

A poesia é quando

Delicio-me com as palavras
que se acasalam em minha frente
a poesia é quando
as palavras estão no cio
- Bianca Velloso -

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

O Próximo


N´alguma frívola alcova
Assoalham-se ratos,
Teiam-se insetos
E gozos secretos.

Sobre o leito tamborilam
Corpos alheios...
Não mais tardar,
O próximo a adentrar.

Alvejo buço e suíças,
Cartola e poucos fios.

Uma bengali a repousar.
Sórdidos desvarios!



 - Paula Tejano -

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Meta


Há quem queira segurança e estabilidade...
Eu não!
Eu quero meus cabelos ao vento
quero bandeira forte
quero o mundo sem fronteiras
quero vivenciar a igualdade
quero voar nas asas da intensidade!
 
- Bianca Velloso -

 

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Peleia (ou Gralha Azul)



Quero viver até ficar bem velhinha
tecendo versos de amor e liberdade
encarar os olhos da morte
guerrear contra ela e vencê-la
com a ponta de uma estrela
- e um sorriso -

Depois?

Depois quero virar borboleta,
passarinho ou vaga-lume
- qualquer bicho que "avoe" -
que é pra poder espalhar poesia
- tal qual Gralha Azul -
sobre o campo e a cidade...

- Bianca Velloso -

terça-feira, 11 de junho de 2013

Grão de Poesia



Sementes de girassol
para fazer brotar a poesia
Mensagem na garrafa
 ao oceano onírico
a procura de quem queira
cultivar a fantasia.

Bianca Velloso

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Do sentir-se livre

Vejo o mundo em preto e branco, uma dicotomia já meio clichê. Não te esqueças: não pensas, logo existes. Afinal, raciocinar é deixar ser conduzido pela emoção, ou seja, outra forma de religião. Estarias condenado à meretriz liberdade? Serás livre apenas quando te libertares dessas malditas teorias - acadêmicas, epidêmicas ou contagiantes. 

segunda-feira, 20 de maio de 2013

À vida dos boêmios ou excertos de sujeitos ex-certos!

Desliza-se entre teorias mil, território latino-americano. A cevada invade as veias – artísticas ou artificiais. A conversa flui. O datar é o fazer o exercício diário de questionar o que é – ou não é - real. A trilha sonora era variável. Lembrei-me de... que existo. Insisto: a sintonia é latente, visível a todos e, é claro, a todas. Riqueza de experiências? Questionar a validade da hegemonia do puro, intocável. Com ou sem partilhar? Compartilhar, verbo há muito esquecido, mas que por razões das mais diversas ressuscitou, nada data de hoje, mesmo não sendo tão religiosos assim. 

sexta-feira, 10 de maio de 2013

On the birds and the bees

From the nothingness’ depth, I am wandering: what is life but havoc? Events seen from a different perspective. Burning flowers have no smell - like a teen spirit does. Your curves are the crucial place where I lose myself with no bureaucracy – it is a matter of spelling and nothing else. It is a lovely night. It is coldish, there is room for happiness. Let me whisper some nonsense and let it be: why such reluctance? Let’s talk about the birds and the bees… Mysteries around the universe make me aware of our rationality’s fragility. What is that thing beyond the sun?

[L!]

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Notas fúnebres

(Dedicado ao Seu Toninho)

Podemos adiar vários encontros, atrasar em tantos outros, mas somos forçosamente pontuais quando é chegada a nossa hora...

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Anjos e outras miragens

Chove. O relógio na parede marca uma hora da manhã. Ao lado da cama de solteiro, fotos de um casal que pare estar feliz. O que seria a fotografia senão a tentativa de aprisionar o passado?, pensou. A chuva persiste. Na cabeceira, uma obra sobre anjos. Seria possível fazer um pedido a algum deles? O sono vem, mas a saudade continua. Já é tarde, os anjos provavelmente viraram as suas costas e já não mais ouvem pedidos inocentes...

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Conversando com o Velho Ateu

Chego à conclusão de que estou ficando cada vez mais louca. E confesso que adoro minha loucura. Quanto mais louca fico, mais me encontro. Tenho gostado da minha própria companhia. E quanto mais gosto da minha própria companhia, mais aberta fico para o coletivo. E se alguém discorda das ideias que brotam da loucura, as discordâncias (que são bem diferentes de discórdias) se transformam em alimento para a escrita.

Saí cedo para a labuta de sábado. Uma hora de viagem para chegar ao trabalho. Catei um cd na estante, liguei o som do carro e parti. Foi uma música do cd escolhido que, naquele momento, despertou a loucura que alivia a dor da existência. A música é doída, mas a dor também abre o caminho para que a fantasia preencha a alma:
O Velho Ateu
 (Eduardo Gudin / Roberto Riiberti)
Um velho ateu
Um bêbado cantor
Poeta
Na madrugada cantava essa canção seresta
Se eu fosse deus
A vida bem que melhorava
Se eu fosse deus
Daria aos que não têm nada
E toda janela fechava
Pros versos que aquele poeta cantava
Talvez por medo das palavras
De um velho de mãos desarmadas

A imagem das janelas se fechando para a poesia foi muito forte para mim... A imagem do medo das ideias de quem pensa diferente... Me doeu a dor do poeta. Não tenho religião, mas adoro pensar sobre a existência de Deus. Abri minha janela e acolhi o poeta. Depois abri também a porta, engatei meu braço no dele e saímos dançando pela manhã que, de repente, virou madrugada. Sentamos na calçada, com um copinho de pinga e uma cerveja até a madrugada se confundir com a própria vida naquela conversa-voo:
Não acreditas em Deus, Poeta? O que ou quem é Deus? Há quem diga que foi Deus quem criou a humanidade... Também há quem diga que foram os homens que criaram Deus... Penso que não dá para negar a existência de Deus, mas não cabe no meu pensamento (nem no meu coração) o Deus construído dentro das religiões hegemônicas no Brasil. Nos meus sonhos de poetisa desvairada, Deus não é pai nem mãe, não é feminino nem masculino, não tem forma, mas no universo da poesia pode ter cor e cheiro... Deus é a energia vital de amor que circula no universo... É a melhor energia que existe por aí, no ar e dentro dos seres vivos... Creio que tanto esta energia é produto da humanidade, quanto a humanidade é produto desta energia.


Sabe aquela história "do pó viemos e ao pó voltaremos" e da tal "vida eterna"? Energia pura, essência em forma de poesia... A gente nasce dessa energia, a vida principia num poema absurdo e concreto, cujo ápice é o ato sexual... E quando a gente morre - um outro poema - o que fica é energia que alguns chamam de espírito: o que se amou, o que se lutou, os gestos de carinho... Seja debaixo da terra, seja no mar ou em forma de cinzas, a energia que fica continua a influenciar a vida...


Também já me fecharam as janelas, caro Poeta... Puro medo... Medo da minha loucura, medo da minha fantasia... Medo do caminho de liberdade que existe dentro do pensamento... É mais fácil ser escravo do que ser livre! Nem todo mundo sabe voar! Tenho pena deles, que não percebem que tudo é poesia!


As religiões não são ruins, meu amigo, elas também transformam essência em poesia... As parábolas são poemas... Há quem goste, há quem não entenda, eu sempre gostei de versos livres e gosto de poesia que liberta... Às vezes as Igrejas usam a poesia para colonizar mentes e corações... Algumas correntes religiosas até ajudam no processo de libertação e rompimento com o sistema, acho louvável e respeito imensamente, mas minha fome de liberdade é ainda maior, quero sonhar meus próprios deuses, quero ligar-me a esta essência através da arte, do amor, da diversidade, da pluralidade!


Tu não estás sozinho! E nem eu! Tu com as tuas ideias e eu com as minhas podemos sim compartilhar carinho! Qualquer hora a gente se encontra de novo, nas esquinas da fantasia...

Despedi-me com um abraço apertado e um beijo no rosto. A madrugada virou manhã novamente. Acordei do sonho que sonhava acordada, desliguei o motor do carro e fui trabalhar com a alma repleta de poesia.

- Bianca Velloso -

sábado, 30 de março de 2013

Uma tentativa de escrever sem gravidade

Desprender-se do materialismo. Viver à moda marginal. É, ora pois, um tempo para lá de moderno. Vive-se, desse ou d´outro modo, sob a égide do capitalismo. Amar é um ato de coragem. Assim, amo-te corajosamente. É preciso imaginar-se feliz, assim como Sísifo o fez. Ser livre é uma questão de classe pequeno burguesa - se não a tens, lamenta-se.  

quarta-feira, 27 de março de 2013

SUAVE (Para Maria Soave)

Soa o trilo da ave
Que corre o mundo
E repousa no fundo
Do coração da gente

Sou ave da terra
Suave
Sem guerra
Amor ingente

Soave do conto
Do canto
Da alegria
Suave sol de poesia

Marta Magda
(Janeiro de 2004)

VERBO AMAR

No vazio
Quando corpo e alma emudecem
O tempo do verbo é passado
O presente é a saudade
E o futuro...

Do pretérito
Eu queria...
Eu diria...
Eu faria...

Que triste conjugação
A desse amor
Declinação da minha dor

Marta Magda
(Novembro de 2003)

quinta-feira, 21 de março de 2013

Um soldado da poesia

Conheci um  poeta
um velho menino
de poetar maduro
e versos mitológicos

Sou poeta menina - aprendiz - popular
gosto da poesia do povo
de linguagem simples
e palavras cotidianas

Ele calmamente me ensina
fala de deuses gregos
de ilhas flutuantes
de tempo, de espaço e de sonho...

Me comove mais o poeta
do que seus poemas eruditos
Um heroi que resiste, persiste
insiste em espallhar poesia

Um gigante, um sobrevivente
um homem que não se rende
à perversidade do sistema
ama, reclama, declama

Não importa a velocidade do hoje
o poeta tem outro ritmo
olha, observa, percebe, sente...
Para, conversa, filosofa, faz versos

Sua aparência frágil oculta um guerreiro
avesso à tecnologia
que não sucumbe à racionalidade...
É gente assim que salva o mundo!

- Bianca Velloso -

quarta-feira, 6 de março de 2013

O autômato


Respiro por preconceito. E contemplo o espasmo das ideias, enquanto que o Vazio sorri a si mesmo… Não há mais suor no espaço, não há mais vida; a menor vulgaridade a fará reaparecer: basta um segundo de espera.
Quando se percebe existir, experimenta-se a sensação de um demente maravilhado que surpreende sua própria loucura e busca inutilmente dar-lhe um nome. O hábito embota nosso assombro de existir: somos, e vamos além, ocupamos nosso lugar no asilo dos existentes.
Conformista, vivo, tento viver, por imitação, por respeito às regras do jogo, por horror à originalidade. Resignação de autômato: simula fervor e ri disso secretamente; só submeter-se às convenções para repudiá-las às escondidas; figurar em todos os registros, mas sem residência no tempo; salvar a cara, quando seria imperioso perdê-la… Aquele que despreza tudo deve assumir um ar de dignidade perfeita, induzir ao erro os outros e até ele mesmo: cumprirá assim mais facilmente sua tarefa de falso vivente. Para que mostrar nossa ruína se podemos fingir a prosperidade? O inferno não tem boas maneiras: é a imagem exasperada de um homem franco e grosseiro, é a terra concebida sem nenhuma superstição de elegância e de civilidade.
Aceito a vida por cortesia: a revolta perpétua é de tão mau gosto como o sublime do suicídio. Aos vinte anos se rompe em impropérios contra os céus e a imundície que cobrem; depois se cansa. A pose trágica só corresponde à puberdade prolongada e ridícula; mas são necessárias mil provas para alcançar o histrionismo do desapego. Quem, emancipado de todos os princípios de costume, não dispusesse de nenhum dom de comediante, seria o arquétipo do infortúnio, o ser idealmente desgraçado. É inútil construir tal modelo de franqueza: a vida só é tolerável pelo grau de mistificação que se põe nela. Tal modelo seria a ruína da sociedade, pois a “doçura” de viver em comum reside na impossibilidade de dar livre curso ao infinito de nossos pensamentos ocultos. É porque somos todos impostores que nos suportamos uns aos outros. Quem não aceitasse mentir veria a terra fugir sob seus pés: estamos biologicamente obrigados ao falso. Não há herói moral que não seja ou pueril, ou ineficaz, ou inautêntico; pois a verdadeira autenticidade é o aviltamento na fraude, no decoro da adulação pública e da difamação secreta. Se nossos semelhantes pudessem constatar nossas opiniões sobre eles, o amor, a amizade, o devotamento seriam riscados para sempre dos dicionários; e se tivéssemos a coragem de olhar cara a cara as dúvidas que concebemos timidamente sobre nós mesmos, nenhum de nós proferiria um “eu” sem envergonhar-se. A dissimulação arrasta tudo o que vive, desde o troglodita até o cético. Como só o respeito das aparências nos separa dos cadáveres, precisar o fundo das coisas e dos seres é perecer; conformemo-nos a um nada mais agradável: nossa constituição só tolera uma certa dose de verdade…
Guardemos no fundo mais profundo de nós mesmos uma certeza superior a todas as outras: a vida não tem sentido, não pode tê-lo. Deveríamos nos matar imediatamente se uma revelação imprevista nos persuadisse do contrário. Se o ar desaparecesse, respiraríamos ainda; mas sufocaríamos no mesmo instante se nos fosse roubada a alegria da inanidade…

Emil Cioran, Breviário da decomposição

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Alguma inquietude pela manhã


Uma tarde de segunda-feira
deve sempre se configurar na neblina
Hoje chove e no centro da cidade nada se enxerga a não ser a ausência de tempo de todos
uma mulher atravessa a rua sem pressa seu olhar me atravessa
aquela mulher com olhos fundos, fundos de vida, um vácuo na neblina
e eu assustada com aquele personagem
corte no asfalto
pausa no tempo
eu molhada, talvez atordoada
a mulher atravessa a rua como um campo de batalha calmamente envolta a sua capa, suas olheiras e um pouco de rancor, expressão daqueles que exalam em suas peles uma maturidade saturada, talvez rachaduras ou dobras do devir
não conheci aquela mulher mais do que três segundos cristalizados em minhas retinas
seus fugidios movimentos tão citadinos, eu tão estrangeira...
Não era fotografia, era gráfico, tinha sensibilidade, mas não se eternizou,
a não ser em minha memória meio cinema, arte cidade... Ou Godard em dias cinza.

Este poema foi escrito por "Nas Moradas do Desassossego".

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Liberdade, igualdade e fraternidade?

Se nascer é estar condenado à liberdade, o que significaria o desfalecimento? Se o que nos prende nesse universo é o pensar em um sentido mundano, por que ainda há vida? Se categorias filosóficas fazem o ser algo mais suportável, o que é o amor? Os poetas querem impor a metafísica naquilo que somente pode ser comprovado pelos sentidos, os mesmos (sentidos) que nos enganam até que consigamos adormecer. Isso, é claro, se formos demasiadamente otimistas para acreditar que há um despertar. É preciso, desso modo, partir do pressuposto que ainda exista, em partes, alguma liberdade, mesmo que não seja remunerada pelo sistema que sempre se critica. Há cabimento?, questiona-se. Por que deveria haver?, retruca-se.  

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Música para ouvir

A faca que abriu a ferida
Chegou foi via celular
No momento em que 
A guria dirigia...

Depois de desligar 
ligou o rádio com pressa
- compressa -
para o sangramento estancar:

"Canta, Arnaldo Antunes
Canta bem forte que preciso muito de ti
Canta que teu canto acaricia e acalenta!"

"Música para ouvir"
Música que entra pelos poros
Atravessa o corpo e a alma e vai além...

- Bianca Velloso - 

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Pai

De todas as feridas que traz na alma, existe uma - apenas uma - que de vez em quando ainda sangra. As outras - talvez nem sejam tantas - já cicatrizaram tão bem que lhe ajudam a compor o caráter e equilibrar o temperamento. Usando as palavras, como se linha e agulha fossem, ela tenta suturar a ferida que neste momento encontra-se aberta. Esta ferida tem um nome curto, apenas três letras, mas é tão profunda que pode lhe causar hemorragia... A ferida chama-se Pai...

Tudo bem que ele refizesse sua vida e tivesse outros filhos... Tudo bem que ele não pudesse - ou não quisesse - colaborar financeiramente...  Tudo bem que ele lhe tirasse a casa... O mundo material não era o mais importante, além do mais a falta deste tipo de apoio fez com que ela aprendesse a caminhar com as próprias pernas... Tudo bem que não comungassem dos mesmos ideais... Tudo bem que ele não fosse visitá-la... Ela só queria estar perto e contentava-se com migalhas de afeto...

Há dezessete anos, ela era uma menina metida a revolucionária e poeta. Foi trabalhar com o pai, num centro de adaptação de lentes de contato. A ideia era que trabalhasse apenas durante as férias da faculdade, pois considerava a atividade muito técnica e muito comercial. Ela queria trabalhar com gente, acreditava que poderia mudar o mundo e que o caminho da mudança era a educação, por isso cursava pedagogia. Acabou percebendo que trabalhar com a visão era também poder olhar de perto para as pessoas, e que para mudar o mundo poderia começar pela transformação do olhar...

Para além de toda essa percepção, estar ali naquele meio era estar perto do pai, o homem que ela ainda acreditava merecer o título de heroi.

Quando resolveu aprofundar-se nos estudos e mergulhar no universo das lentes, ele disse que não poderia acompanhá-la... Quem ficou ao seu lado foi a mãe... Mesmo assim ela não desistia de estar perto dele...

Formada em Optometria, enfrentando uma briga ferrenha com os oftalmologistas, lutando para trabalhar, trabalhando com afinco, conquistando espaços entre os integrantes do ramo, ela já estava acostumada a manter com ele uma relação de parente distante... Um dia ele resolveu sondá-la, chegou até a propor parceria... A filha, já não mais tão menina, animou-se, viu novamente a oportunidade de estar perto do pai... Finalmente ele estava reconhecendo seu trabalho, seu valor...

Para seu grande espanto, de repente, descobriu que aquela proposta já não existia, que aquela parceria já estava acontecendo e não era sua... O pai aliou-se a uma oftalmologista... Porta fechada, ferida aberta... Sangrando... O que se pode esperar de um pai que nunca foi pai? A menina-mulher já não quer mais esperar de quem não pode dar afeto... E segue o rumo carregando os mesmos ideiais poéticos e revolucionários de outrora... Talvez ela não possa mudar o pai, mas quem sabe se mudar o mundo - através do olhar e da poesia - a alma não cicatriza um dia?

- Bianca Velloso -

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Um até breve

Há tempos não revia aquelas pessoas
de alguma forma, todos estiveram presente
nesta minha vida.
Alguns ainda estão.

Vejo-os todos barbudos ou cabeludos
ou os dois.
O tempo passou...
Há fumaça pelos cantos da mesas
há garrafas vazias e muitos copos
pela metade.

No entanto, olho para os lados
não vejo alegria naqueles rostos
talentosos.

Há conversa miúda, há até alguns risos
mais animados.
Entretanto, sinto o óbvio
numa despedida

Meu camarada,
percebeu o que poucos perceberam,
que pra este mundo, só uma transformação!
Pra não usar outro termo que afete,
sentimentos pequeno-burgueses.

É camarada, você se desprendeu
neste tempo, de muitas amarras.

E a partir deste momento, passou a existir
uma identidade maior em nossa já muito estimada amizade.
O que nos torna cúmplices – desse desejo por transformar!

Te vejo quieto, camarada...
como quem prevê,
que em uma hora talvez,
seus amigos do peito já terão ido embora.

Eu próprio já o pressinto.
Minha hora se aproxima e eu,
sinceramente, não sei... quando
o verei novamente.

Queria te dizer uma coisa
que não disse na hora, meu amigo.

Minha cara séria não fez perceber,
mas pude notar seus olhos vermelhos...
e quando te abracei só pensava o seguinte:
“Tu é um grande camarada! Vai fazer muita falta!”

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Um conto sobre lendas

Madrugada corria solta, embora silenciosa, enquanto andávamos por uma rua paralela à praia. Os dois amigos, bêbados, já assaltando suas próprias geladeiras na falta de bares abertos naquele bairro miúdo, assim, de um cosmopolitismo provincial – que se infla nos verões da vida -, atrás de alguma cerveja gelada pra amaciar a conversa. E um assunto secundário que acabou se tornando um clássico da verborragia noturna, gloriosamente relembrado na tarde de sol seguinte quando a filosofia fraterna se aprofundava, se estreitava, de frente para o mar. Pois. G. e H. são amigos velhos. Nem tanto. 10 anos? Dá pra cravar. Estão flertando com os 30. Quer dizer, um já está entrando neste cômodo, o outro, bem... este gajo ainda olha assustado, pra este cômodo nada cômodo da casa dos 30, de certa forma. E, voltando à rua silenciosa, daquela noite, que de tão noite já se diz que era madrugada, uma madrugada paralela à praia, se é que posso assim dizer. Bem, então. G. do alto de todo um sistema de argumentos desenvolvidos na medida em que seus passos evoluem, assimétricos, pela mesma rua, diz, essa coisa de pós-modernidade é uma loucura. Hoje se vive tudo no agora..., vivemos, meu caro, sob a égide do presentismo, as pessoas querem o prazer imediato e ponto, não importa lá muito o que vem depois. Houve um tempo que se desejava viver e ter uma continuidade após a vida, deixar um nome, deixar sua marca no mundo para que quando a pessoa morresse, alguém, enfim, as pessoas lembrassem dela. Como a construção de um ícone, certos homens desejavam viver como lenda, na posteridade. Dito isso, toma mais um gole quando H., que vinha concordando com a cabeça, dispara: é cara... as pessoas hoje não se preocupam muito com isso. Mal termina e G. continuando seu pensamento, diz, sério, cara... perguntei pra minha mãe o que ela pensa sobre isso, se quando ela morresse ela pensa se alguém vai lembrar dela, das coisas que ela fez... H. interroga, rapidamente, o que ela disse? Ela não disse nada, os dois riem. De repente silêncio sobre o silêncio da rua e H. dispara, cara... eu acho que meio que já sou uma lenda. E, num rompante sereno, porém mais rápido que aqueles disparos em duelo de faroeste norteamericano, G. olha pro alto dizendo, lenda? H. se vc morresse amanhã ninguém ia lembrar de vc, e antes que H. pudesse pensar, emendou, nem seus pais! H. esboçou a tela em seus pensamentos, o dia seguinte, falecido, e em sua casa a mesma rotina, inabalada, como se não tivesse ocorrido nada, seu pai assistindo futebol, sua mãe lendo alguma coisa ou escrevendo, enfim, como se ele nunca tivesse existido. Alguns segundos em silêncio sobre silêncio que já esteve sobre silêncio e H. desata numa risada fora de controle que logo atravessa G., que não sabendo bem que era especialista em demolir lendas, se dava conta da tragédia dita, e já soltava lá suas risadas também. Não sei exatamente quantos segundos duraram aquela risadas, mas, na tarde seguinte gerou riso de ambos novamente à lembrança do ocorrido.

E H. sabe, embora não admita, que andou rindo sozinho pela casa, depois que voltou da rua. Clássico da verborragia noturna? Maneira de dizer. Não deve durar mais que dois dias, possivelmente, este lembrança. Provavelmente H. deve julgar o contrário e G. ao ler estas linhas, já o deve ter esquecido. Ou não.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Solilóquio pré-carnavalesco

(lira dos trinta anos – e meio)

Lá se vão os cabelos,
vão perdendo o tom
desafinando, então?
(numa procissão silenciosa, sem marcha ré)

O corpo já demora
a responder,
tenho pressa,
angústia;

As festas de rua
estão chegando.
Os barulhos, a alegria apenas... embora efêmera.

O passado volta,
devastador...
ainda não, passado (uma vírgula de "penetra")
não foi dessa vez.

06-02-13

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Manifesto saudosista

Dedicado à P.


                   Equivocam-se aqueles que em nome da língua portuguesa defendem a originalidade sentimental e estética da palavra saudade. Lembremos da Torre de Babel e dos processos linguísticos envolvidos em tal façanha: tinha-se o objetivo de construir uma torre que chegasse até o céu. Os arquitetos e construtores de tal monumento, pelo o que se conhece, falavam a mesma língua. Tudo transcorria bem até que o bom deus roga-lhes uma espécie de praga, sendo que, segundo o livro sagrado, as pessoas envolvidas nessa empreitada arquitetônica são castigadas a se comunicarem através de línguas diversas; o que parece, em teoria, impossível. Essa diversidade linguística, ainda na escrita divina, lhes trouxe caos e devido à incomunicabilidade a Torre, dessa maneira, não pôde ser concluída. Essa é a versão que nos foi apresentada, mas eis que milagrosamente apareceu uma outra que é apócrifa, diz-se que foi escrita pelo professor Woland, onde os fatos podem ser mais apurados pela solidez do conteúdo e a similaridade com os nossos dias.  
Segundo o professor, uma testemunha ocular do evento, a não concretização da empreitada daqueles que originalmente falavam a mesma língua, não se deveu aos problemas e complexidades idiomáticas. Os movimentos migratórios que quase sempre existiram e ainda continuam a existir na Europa não são impedidos tão somente pelo fator língua - apesar de Vilém Flusser construir toda a sua filosofia sob o pretexto que a língua criaria a realidade -, tanto é que hoje em dia não é difícil encontrar húngaros, poloneses e brasileiros que mal sabem falar os números em inglês, mas que, entretanto, moram e até trabalham na Terra da Rainha, apesar dos pesares. Com isso, o respeitável Woland chama a atenção para um fato humano, demasiadamente humano: A intenção de se construir a Torre de Babel foi, por si só, um atentado às entidades divinas, uma vez que o comportamento desses humanos foi como se quisessem se tornar deuses ou semi-deuses. Imaginando ser possível fazer o uso do anacronismo, seria dito que a Torre foi uma obra faraônica. Assim, a não concretização da Torre não foi devido à incomunicabilidade entre as pessoas relacionadas à essa empreitada esquizofrênica, mas sim ao jogo de interesses.
No início da construção, não havia separatismo ou sequer grupos que trabalhavam de modo isolado. A coletividade estava envolvida em prol de um objetivo: chegar até o céu. Quando este ocorrido chegou ao setor de notícias do divino – não podemos esquecer que os órgãos, inclusive aqueles pertencentes à burocracia divina, têm se setorizado cada vez mais -, dizem as más línguas que o todo poderoso enfureceu-se de tal maneira que acreditou ser preciso lhes rogar, como já descrito, uma praga, mesmo não sendo primavera. Para tanto, fez com que a até então única língua se confundisse, misturasse e que no lugar teriam diversas línguas. Que desnecessário!, pensou o professor Woland na ocasião. Mesmo com toda a diversidade linguística, a construção continuou e isso é o que não está escrito, afinal não se quer contrariar a vontade dos escritores bíblicos. A inocência nos forçaria a questionar como isso foi possível. Woland, antecipando a nossa curiosidade, respondeu que o projeto estava desenhado e as funções já estavam previamente designadas, antes mesmo da intervenção d’Ele. O grande problema, volta-se a dizer, foi o caráter humano, demasiadamente humano: pelos jogos de interesse, começaram a se firmar pequenos grupos. Houve separação. O projeto coletivo começou a se tornar mais individual. Fingiu-se não entender aquilo que já estava designado - é comum os humanos se esconderem por detrás de desculpas que possam justificar seus fracassos.
A partir de então, a Torre ficou apenas na lembrança, um sonho que não conseguiu ser concretizado. Assim, o leitor que conseguiu chegar até essa parte do texto é convidado a ser perguntar: o que a Torre de Babel teria a ver com a palavra saudade? Diferentemente de uma fábula, onde os olhares são voltados para a sugestão do autor, seja um autor defunto ou um defunto autor, aqui não será sugerido muita coisa. Também não haverá uma moral da história. Mas não te desanimes. Aqui, será exposto uma manifestação de repúdio aos supostos detentores das palavras, aqueles que acreditam poder cristalizar a vivacidade do universo literário, algo tipicamente acadêmico. Leia-se: imoral. Não se pode aprisionar as letras que transitam e que embelezam a transitoriedade do Ser. Então é preciso pensar em voz alta: Por que defender a exclusividade do dizer ‘’saudade’’? Não sentiria saudade um inglês, aquele que não detém essa palavra no seu vocabulário? As vaidades...

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Sobre os espaços, a pausa e a poesia

 
 
Assim como a canção 
Necessita de pausas
O amor precisa das ausências
Espaços, aliento...
E neste lugar de saudade
- insterstícios de poema -
mergulho meus sonhos
E vou tecendo a poesia.
 
- Bianca Velloso - 

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Sobre linhas e outras banalidades

Imaginemos uma linha. Não há começo, meio ou fim. Sem tentações, não utilizaremos conceitos divinos: com isso, tira-se a Gênese e esquece-se do Apocalipse, apesar de não se descartar a presença de Mefistófeles, afinal ele é quem confere o caráter tortuoso nessa jornada. Somos, dessa ou de outra maneira, forçados pela etiqueta social a trocar as nossas máscaras diariamente: vestimos as vestes que escondem a nossa vergonha. É preciso acreditar que tal façanha é possível! Nessa linha, infinitos pontos, isto é, alguns encontros. De todos os desencontros, encontrou-se com um adorável ponto de referência. Como suportaria aquela ausência?, uma pergunta que o perseguia. As letras eram seu conforto, seu objeto. Era como se a linha terminasse ali uma trajetória e seguisse, a partir daquele ponto, uma fusão: duas linhas ocupariam o mesmo espaço? A linha, como parte da ficção, bem poderia ser imaginária, mas o sentimento, finito ou não, dizia-se que era real.  

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Qual a direção?



Quando perder o rumo
Quando não souber mais o caminho
Basta lembrar:
Quem dá a direção são os sonhos
Que a gente inventa, reinventa, edita e reedita
Sempre que for preciso.
E o sentido?
Sempre à esquerda, por favor!

- Bianca Velloso -

domingo, 30 de dezembro de 2012

SEM-TETO (para Mário Quintana)

Se no verso do poeta
"Amar é mudar a alma de casa"
Por certo
Sou agora sem-teto

Marta Magda
(Dezembro 2003)

DE MÃOS, BEIJOS E CORPO...

Gostava de tuas mãos
Gostava de teus beijos
Gostava do teu corpo sobre o meu
Gostava de te ver...

Não era gosto
Era bem-querer

Gosto de lembrar de tuas mãos
Gosto de lembrar de teus beijos
Gosto de lembrar o teu corpo sobre o meu
Saudade, gosto de dor

Não é gosto
É amor

Marta Magda
(Novembro de 2003)

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Queria...


Queria dar-te o céu
Com seu infinito azul
Suas estrelas a pulsar...
Se eu pudesse
Dar-te-ia o universo
Verso por verso
Frente e verso!

- Bianca Velloso -