sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A certeza de estar só...lido


Havia uma separação. Sólida, separados pela solidez. Dois mundos estavam separados e essa separação era sólida: de um lado, um menino; do outro, uma menina. E a separação se dava por uma parede de concreto. Mas o que para mim não se tornava concreto era, com efeito, essa separação. Tão próximos, e, ao mesmo tempo, tão distantes.

Assim, pregavam os manuais de sabedoria que, assim se proclamavam, diziam-se modernos, contemporâneos, pós-modernos ou, quiçá, hipermodernos. Confundiam-se aos montes. Apenas uma coisa, dentro de todo esse imaginário temporal, eu considerava fato: a sólida separação.

Não sabia, ao certo, muita coisa. Apenas não entendia a solidão daqueles seres. Estavam solitários. E quando, assim me referi, digo, falo sobre os dois. Ele, com seu brinquedo, só. Chamava-se Bruno. Ela, também com seu brinquedo – creio que era uma boneca -, só, modernamente só. Li, dia desses, em Vilém Flusser, uma citação do filósofo José Ortega. Disse que ''eu sou eu e mais a circunstâncias.'' Depois filosofei – e também comecei a crer que a idade nos torna doutores em filosofia: a solidão também é uma circunstância?

Temo estar demasiadamente saudosista. Os anos – por instantes refleti – nos deixaram sós e a sós? Quem poderá entender o amor se se tem amado pouco? O saudosismo remói. E os fatos contados através dele têm sido desconexos e têm produzido efeitos desconcertantes. E assim tem sido.

Tínhamos, lembro-me da minha eterna infância, coisas em comum. Compartilhávamos machucados e histórias sobre beijos roubados. O que, isso nos dias de hoje, mudou? A solidez, estupidamente arrisco. Quem sabe ainda existam experiências a serem compartilhadas, mas, talvez hoje, resistimos – ou nos fazem resistir – a idéia de compartilhá-las, dividi-las e, quem sabe também por isso, as crianças vivem sós.

Soou o alarme: Jorge, é hora do seu almoço! Pára de resmungar e coma logo. E para não deixá-lo sozinho e falando sozinho, hoje e apenas hoje eu te faço companhia.









Quadro: Memória
Autor: René Magritte

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